49. Lincoln – 13/02
Com uma trama histórica interessante e importante para a compreensão
dos EUA e, consequentemente, de questões relacionadas a todo o continente
americano, Steven Spielberg poderia ter feito um filme político, mas não
resistiu à tentação de endeusar e mitificar a figura de Abraham Lincoln. Assim,
em vez de um ser humano falho e complexo num cargo delicado, temos diante de
nós um ‘mito’, um grande homem, de gênio inigualável, que enfrentou tudo e todos, que lutou por uma causa por...
porque era um grande homem.
Apoiado na caracterização impressionante de Daniel Day-Lewis
(um ‘monstro’; como de costume, dá uma aula e faz valer o ingresso) e num elenco que talvez
só alguém de sua importância consiga reunir - Tommy Lee Jones, fabuloso, além
de David Strathairn, James Spader, Hal Holbrook, Joseph Gordon-Levitt, Jackie
Earle Haley, Tim Blake Nelson, entre outros - Spielberg perde a oportunidade de
se aprofundar na questão política da abolição da escravidão para seguir a
‘cartilha’ (que ele ajudou a criar, diga-se de passagem), subindo a música para
emocionar, sem pudor de manipular o espectador. Na cena da votação da emenda, ele quase me pegou. Até que pensei: 'Se todos estão contando os votos, da Câmara aos soldados, pra que o mistério e a demora em revelar o resultado?'. O resultado é a
estranha sensação de 'já vi esses truques antes'. Sorria, você está sendo manipulado.
Não satisfeito, Spielberg ainda cria arcos artificiais e
melodramáticos (todo a história da família de Lincoln, em especial as intervenções de Sally
Field, caricatural e dois tons acima do necessário).

É uma pena ainda que ‘Lincoln’ se inclua no hall dos filmes que
tratam de direitos dos negros com uma visão predominantemente branca (incluo aí
também o deplorável ‘Histórias Cruzadas’), estabelecendo escravos como
‘coitados’ à espera do homem branco que vai salvá-los da escravidão.
Simplesmente lamentável.
E viva Django, explodindo a Casa Grande e fazendo justiça
histórica na ficção!
MEMO: A cena que se passa, se não me engano, na noite
anterior à votação da emenda, em que Lincoln é veemente e fala duro pela
primeira vez com os membros mais próximos de seu gabinete.