Encruzilhada

Encruzilhada

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Um poema por dia - 23/10 - O fardo por baixo da pele

23/10

O fardo por baixo da pele

Que haverá com o sentimento
Que não onde quer que se vá?
Será isso quem de fato se é
E no fundo, no fundo
Para sempre será?

O que se veste sob a roupa
E sob a pele
Que de dentro do corpo
Se revele
Carregado por muito
Existido desde tudo
Uma parte do todo
Sempre aberta
E alerta

Um cheiro que não se tira
Mancha que não se limpa
A triste essência de ser
Enfim
No fim de andar e crescer e mudar
Assim

Um gosto presente na boca
Nem doce, nem amargo
Nem salgado
Só o mesmo
Fardo
Costurado, carregado no bolso
Pesando pesado
E um dia, como de cansado em desgosto
Vive suportável suportado.

Um poema por dia - 22/10 - O dia em que você me disse não

22/10

O dia em que você me disse não

Suas palavras andam num trilho
Um trem que vem na minha direção
Sem aviso viram dedo no gatilho
De uma bala é feita minha escuridão

Enquanto meu ser, roubado de vida
Derrete derramado pelo chão
A carne aberta, ferida
Ainda tem a marca da tua sua mão

O espaço que abriu no peito morto
Tão quando me arrancou o coração
As marcas que deixou pelo meu corpo
No dia em que você me disse não.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Um poema por dia - 21/10 - A jornada da nascente

21/10

A jornada da nascente

O filho do desejo
Anuncia sua viagem em silêncio
Na velocidade de um lampejo
Cobiça acima o topo, o aumento
Rasteja pela margem da rua
Beirando a fronteira do tempo
Alcança o tamanho da lua
Move-se na batida do vento
Correrá este ser ao encontro
Algum dia, deste aqui presente
Implacável esperar, pronto
O pedaço que faltava pra torrente.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Um poema por dia - 20/10 - A espera

20/10

A espera

Esperando
Por que espera?
Não esperamos todos
Por algo por vir
Pois o amanhã é sempre escuro
Embora haja limites ao ter
Não os há para o querer
E o ansiar
Algo a mais viver
Algum dia será o bastante?
Haverá o bastante?
Aguardemos
E aprenderemos enquanto esperamos
E esperamos para aprender
E aprendemos a esperar.

domingo, 27 de outubro de 2013

Um poema por dia - 19/10 - O professor

19/10

O professor

para Gabriel

O professor vê o brilho
de coisas simples do dia
cães brincando no parque
uma caminhada na beira do rio
falando de lá 

Deitado na grama ensolarada
com a alegria
e o sorriso de garoto que conserva em si,
o professor preguiça na manhã fria
e levanta ao som de Fela Kuti
quase dança sentado no beat do jazz

O professor respira música
e vive para ela
e faz de pensamentos e palavras
mais que voz
sua janela
e se já foi guitarra
o professor hoje é baixo
no groove, na classe
ainda que às vezes
no fim do dia
também seja bateria

O professor é o melhor amigo do silêncio
mas não deixa de lutar
acreditar
e mudar para maior
pois o professor também aprende
e se um dia marcava espaços
hoje se rende ao calor dos abraços

O professor não grita, não sobe em mesa
nem bate no peito
não é euforia
mas sente, sente tudo
como eu
pois ao me ensinar
também fez de mim um pouco seu

O professor me ensinou
me protegeu
me preparou
tomou os golpes que eram meus
é um quinto de nós cinco
e a terça parte de mim.

sábado, 26 de outubro de 2013

Um poema por dia - 18/10 - A pérola

18/10

A pérola

Encantos de acordes rasgados
Vocais rugidos do fundo da garganta
O pranto da juventude
O grito de liberdade
Libertem-me!
Coragem que se agarra
Por um fio, com uma mão
Façam bandeiras de amarras
Vejam a evolução
Lançado no chão
Com sangue nos olhos
E fúria nos traços
Exatos
De um rosto alucinado.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Um poema por dia - 17/10 - Os dois, ao sol, no fim do tempo

17/10

Os dois, ao sol, no fim do tempo

Lado a lado
Não se tocam
Pouco falam

Ele esconde os olhos
Ela mostra as lágrimas
Ele cinzento, frio
Ela de vermelho na pele

Sentados diante do rio
Abaixo do sol
De frente pro fim

Feridas se misturam
No corpo e mais fundo
Para onde irão daqui?

Cada um com seu caminho
Sempre com outro em si
Sempre lembrando do fim.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Um poema por dia - 16/10 - Todos os lados do seu mundo

16/10

Todos os lados do seu mundo

Sua caixa
basta
Se larga o bastante
para você
Vasta
à medida de viver
E conhecer
o relevante
Com o desafiante
do outro lado da faixa
E você, hesitante
de guarda baixa
Sabendo que a verdade algum dia
Se encaixa.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Um poema por dia - 15/10 - A valsa

15/10

A valsa

A jovem alegria
Uma pequena jóia
Sua voz distante
Na melodia desta valsa
Delicada nas cordas
Enquanto choro
Pensando em não dançar
Haverá algum outro lugar?
Um salão para nós dois
Descalços, na ponta dos pés
Distraídos, desprendidos
Com chance de reencontrar
A valsa de nós dois perdidos.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Um poema por dia - 14/10 - Dormir não mais

14/10

Dormir não mais

Fantasmas da noite morta
Caminham entre luz e sombra
E névoa
Por rastros de cobiça e treva
Lânguidos, lúgubres
Embebidos no sangue de uma casa
Entre árvores que andam
Espíritos que dançam
A noite de ontem
E repetem seus caminhos
E refazem seus destinos
Passo a passo no terror
Escravos das horas de sempre
Da negra madrugada rubra
De novo e de novo
Despertos de loucura
Em torno da figura
Morta
Atrás da porta
Jaz o segredo do silêncio
Confinadas lá dentro
Almas de outro tempo
Seduzem
As testemunhas de hoje
E o ar se vai, o som se vai
A cama se desfaz;
Nem querer, nem sonhar, nem dormir
Dormir não mais.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Um poema por dia - 13/10 - A condição do paciente presente

13/10

A condição do paciente presente

às vezes me preocupo
em não me preocupar
e me desculpo
em procurar ocupação
ou explicação
para explicar
a vontade de fantasiar
à vontade
em fantasia de verdade
e variar vivacidade
variedade de viver
a idade de lidar
com as metades
e mentir o pensamento
pra pensar por um momento
que querer é sentimento.

sábado, 19 de outubro de 2013

Um poema por dia - 12/10 - A bruta força

12/10

A bruta força

Esta noite sonhei que corria
Contra o vento, o tempo e tudo
Sonhei que sonhava com ninfas
Espíritos livres do mundo
Deidades numa luta trançada ao redor de mim
Caminhando pelas paredes do meu quarto
Numa brincadeira entre si, correndo de um lado para o outro
Sonhei que dançava até perder as pernas de tão gastas
Até que o teto desabasse sobre a minha cabeça
E eu ria
E dançava, dançava até morrer
Sonhei com mulheres brincando de serem meninas
Rio em noite azul de lua cheia
Noite cheia
Noite bela
Num jogo de água e espelho
Brincadeira infantil
Seduzir com batom vermelho
Um carinho no rosto
De um amor desconhecido
E eu me jogava
e mergulhava
e caminhava
E a água me seguia
Numa dança impossível
Como se fosse eu seu guia
E eu via
A dança do fim do dia
E chovia
Sonhei que voava
Saltava de um penhasco
E voava
Rompia paredes
E caminhava
Contra o vento, contra o tempo, contra tudo
E não estava só
Sonhei com a luta de um homem
Seu drama
A força bruta da luta humana
E de tão lindo, tão lindo
Não sei se o sonho era sonho
Ou se era vida.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Um poema por dia - 11/10 - De cima do alto

11/10

De cima do alto

Alto
Mais alto
Tudo alto
Tão longe que a cabeça
Deixa de pesar
Tão grande
Sem mesmo respirar
Alto, alto
Por céu azul limpo
Livre
E mais alto
Mais pássaro que anjo
Mais homem do que santo
Alto e mais alto
Guerreiro do ar
Sobre terra e pensar
Sobre gente
Acima do tentar
Alto e mais alto
Por cima de tudo
Parte de nada.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Um poema por dia - 10/10 - O filho bate à porta

10/10

O filho bate à porta

Trancado na porta de trás
Com tudo pela frente
O quintal diminui
Empurra, faz recuar pro fundo
Pro canto, pro fundo do mundo
A casa é fechada
Porta bloqueada
Janela cerrada
E para sair, para fugir
É preciso entrar
E para entrar é preciso lutar
Sangrar, vazar o corpo
Em vermelho escuro profundo
No canto, no fundo, o fundo do mundo.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Um poema por dia - 09/10 - As manchas que tenho sob meus pés e além são tranças que histórias rompidas detém

09/10

As manchas que tenho sob meus pés e além são tranças que histórias rompidas detém

Essas manchas no chão
Que serão?
Sobras de uma luta,
Pedaços de paixão?
Escurecem as marcas 
Dia a dia a dia
Em passagem, são mortas
Todos passam, elas ficam
Agarradas ao cimento, em união;
Cicatrizes de um tempo, proteção
Sequer sinto com os pés a escuridão
Dos rastros e restos da imperfeição.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Um poema por dia - 08/10 - Os calos no pé do viajante

08/10

Os calos no do viajante

A poeira do seu pé
Não me diz nada
De onde veio? Por qual caminho?
O que queria? Andou sozinho?
Pisando em dúvidas
Incerto nos dedos
Duro na ponta
Diante dos medos
Recua, de pé fechado
Jogado, sensível, cansado
Aberto, posicionado
Pronto pra ir, até atrasado
De novo a partir, condicionado
Habituado.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Um poema por dia - 07/10 - O fim do túnel

07/10

O fim do túnel

Na beira do trilho
Às margens do rio
Sem saber pra onde vai
De onde vem
A água, o trem;
Poderá vir do norte
Trazendo-me sorte
Algo de bom, forte
A noite para um dia qualquer;
Corre o curso a leste?
Ao desejo de uma mulher
Um encontro bem-me-quer
Mal-me-quer;
Rumo ao sul
Ao túnel preto, de fundo azul
Cego, ainda confiante
Na luz de longe, lá, adiante.

domingo, 13 de outubro de 2013

Um poema por dia - 06/10 - O testamento

06/10

O testamento

Deixo fortuna
Agruras e mágoa
Faço ruína
Madura e pesada
Deixo pedaços
Da vida passada
Cumpro percalços
São parte da estrada
Deixo lamentos
Na curva cantada
Parto sozinho
A caminho do nada.

sábado, 12 de outubro de 2013

Um poema por dia - 05/10 - O homem da madrugada

05/10

O homem da madrugada

O homem da madrugada
ouve de longe a chegada
a cavalgada;
Sente solto no ar
Aquilo que está pra mudar;
O cheiro da manhã
O sabor da maré
Os sons do próximo dia
O vento frio no pé;
Pode ver o presente, quase futuro
Tocar o recente, o tempo seguro.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Um poema por dia - 04/10 - Inventário

04/10

Inventário

A ponta
do laço
Do sapato
gasto;
A pegada
apagada
Do cavaleiro
da semana passada;
O prisioneiro
das grades de ouro
O passageiro
o príncipe mouro;
O anel da rua de vidro,
o amor cantado em coro;
O desejo de sempre perdido
um baú de tesouro
em fogo forte derretido.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Um poema por dia - 03/10 - a cartilha

03/10

a cartilha

segure firme
aguente o tranco
acuse o golpe
recorra ao santo
proteja o nobre
respeite o banco
não conte o pobre
eleja o branco
se pegar, o bicho corre
e se comer o bicho manco
pode bem ficar de porre
liberar o próprio pranto
aprender como se morre
e retirar-se para um canto.


terça-feira, 8 de outubro de 2013

Ornitorrinco - Escreva um poema por dia

Texto meu sobre o projeto 'Um poema por dia', publicado no ORNITORRINCO. Obrigado ao super Gabriel Pardal.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

ESCREVA UM POEMA POR DIA



‘Escreva um poema por dia’, o fantasma lhe disse em sonho. Não fui eu quem sonhei; eu vi. Num filme, precisamente ‘HaHaHa’, do coreano Sang-soo Hong. A cena em que uma entidade aparece para um dos protagonistas e lhe diz que escreva um poema por dia (se bem me lembro, para conquistar o coração de uma mulher) ficou na minha cabeça naquele segundo dia de 2013 e, num ano que eu imaginava ser de grandes e profundas mudanças, tornou-se um lema e uma meta. 245 poemas depois (e contando...), o projeto segue de pé, tornado num diário lírico de um aspirante a artista, aprendiz andante e errante num, de fato, ano de profundas mudanças.

Em 2013 passei por uma operação no joelho que me custou seis meses de fisioterapia na moeda mais valiosa que pode existir: o tempo; pedi uma mulher amada em casamento e casei-me com ela alguns meses depois; deixei o trabalho de quase oito anos como jornalista e apresentador de TV para me aventurar num sonho de ser artista; e finalmente, pela primeira vez na vida, deixei de morar na cidade onde nasci e cresci para me mudar para, assim dita, ‘capital do mundo’. E ainda estamos em setembro...

Às vezes um acontecimento, uma pessoa ou um 
sentimento origina uma poesia inteira. Às vezes 
é uma imagem, uma referência, uma palavra ou 
um verso já completo que inicia todo o processo.

Ter os poemas por perto garante um alívio imediato a cada dúvida existencial do tipo ‘o que estou fazendo com o meu tempo’ e uma satisfação confortante e confortável de saber que, mesmo que nenhum dos outros planos desse certo em 2013, com os caderninhos rabiscados (estou indo para o terceiro moleskine) um grande projeto estaria concretizado. Como o ‘366 músicas’, que o nerd profissional Nick Ellis criou – e cumpriu – no ano passado, ao publicar a cada dia no youtube e no facebook um vídeo seu tocando e cantando uma música diferente. Ou como a ideia que a personagem de Miranda July desenvolve em seu novo filme, ‘O Futuro’, o projeto de fazer uma dança por dia.

O curioso é que, por um lado, o pacto interno de manter uma singela contribuição diária implica compulsoriamente numa maior intimidade com o artesanato da expressão em foco (no meu caso, a poesia), ao mesmo tempo em que provoca um desafio de não se repetir. Assim sendo, se percebo que pareço monotemático ou dependente de um único formato, mudo radicalmente de enfoque ou abordagem. Também por conta do ritmo de produção, me é oferecida a oportunidade de experimentar, mesclar e misturar expressões literárias. Há um poema que é um conto em si, outro que resume um conto concreto de minha autoria, também escrito neste ano, versos com cara de letra de música, poesias em formato de cantiga, tentativas de escritos em inglês, uma série de cantos e entre outras, muitas construções que, na prática, nada mais são do que crônicas líricas daquele meu dia (e alguns chegaram a virar vídeo, num esforço para ampliar as fronteiras midiáticas do projeto).

A experiência também me permite investigar, afinal, de onde vem – pelo menos no meu próprio processo criativo – essa tal inspiração. Às vezes um acontecimento, uma pessoa ou um sentimento origina uma poesia inteira. Às vezes é uma imagem, uma referência, uma palavra ou um verso já completo que inicia todo o processo. E às vezes é metalinguagem pura, viagem pura. Por vezes o resultado é surpreendente pra mim quando visto a certa distância: seja no dia ou no mês seguinte, perdi a conta de em quantas oportunidades me peguei lendo o que escrevi e pensando ‘até que isso ficou decente’ ou ‘como escrevi isso mesmo?’. É verdade também que, por vezes, o resultado deixa a desejar e soa como cumprir uma tabela, um dever. Mas sempre é trabalho. E lidando com o fazer poético, o pretenso poeta pode gozar de uma pura e primitiva liberdade ao se dar conta de que tem o poder de pegar o que quiser, adotar a forma que achar mais relevante, interessante ou provocante, e construir à sua própria maneira um verso, um poema. Afinal, adaptando uma canção de Marcelo Camelo, pergunto-me diariamente: quem se atreve a me dizer do que é feita a poesia?
Ornitorrinco - Escreva um poema por dia


segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Um poema por dia - 02/10 - Inferno

02/10

Inferno

Círculos incertos no vazio
Larvas, insetos
No fim da escuridão;
Espera, faminto, o concreto macio
Gigante e sozinho
Anunciação.
Salvação.
Besta no cio
Em busca do feto
Saído daquela prisão;
Olhar fugidio
Vozes voam no teto
Rastejam pelo chão;
Vermelho, arrasta-se o rio
Leva a coroa e o cetro
A algum outro lugar de solidão.

domingo, 6 de outubro de 2013

Um poema por dia - 01/10 - De olhos pra cima e peito pra frente

01/10

De olhos pra cima e peito pra frente

Anoiteceu
E o céu ainda é claro
No banquete das luzes
Das aves de aço
No traço do tempo
Ao passo da lua;
Dos corpos que se jogam,
Cansaço;
Nos olhos que se escondem,
Trabalho;
Fases do dia
Corrida contínua
Preguiça ou fadiga
A hora ilumina.

sábado, 5 de outubro de 2013

Um poema por dia - 30/09 - Um lugar para sonhar

30/09

Um lugar para sonhar

Sorrateiro porém nobre
O sonho se infiltra
Reúne-se em passos
Por ruas cinzentas 
Barulhentas
O impulso de viver essa outra vida
Pedaço por pedaço
Batida por batida
Ergue-se a ponte
No caminhar
Embaçado o horizonte
Neste novo lugar.
A nova York,
Que grande cidade para se sonhar.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Um poema por dia - 29/09 - O espelho do mundo real

29/09

O espelho do mundo real

Haverá beleza na natureza?
In natura
Será pura
Nua
O que há, o que existe
É.
Por si mesmo
Não por dito
Escrito
Vendido
Mas por simplesmente existir
Mais que lindo
Mais que um ser belo
Belo é ser.

Um poema por dia - 28/09 - "Índio, caboclo, cafuzo, criolo"

28/09

"Índio, caboclo, cafuzo, criolo"

De um coração inflado de sangue
Pulsa e jorra a força dos nativos
Do sul
Pais do tempo
Órfãos da História
Espíritos de ébano
Vários em tons
Ricos em sons
Tragam-me o canto da floresta!
Os deuses da água!
A vida que respira rasteira
Em harmonia com a casa
Tragam-me a beleza difusa
Dos amores humanos da noite!

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Um poema por dia - 27/09 - A terra além do penhasco

27/09

A terra além do penhasco

Acima dos montes verdes
ao fim da noite
posso ver você
me chamando
me estendendo a mão;

Há um lugar, além do olhar
de sol nascente, brilhante
sorridente
crescente sobre mar e areia branca;

Deixo sua voz me guiar
obrigado;
e posso ver, posso estar
neste lugar,
a coisa mais bonita que já vi;

E lá estão vocês
num tempo parado
silencioso;
E lá estão vocês
me convidando pr'um abraço;

De pés descalços, flutuo
braços abertos
carregado de amor
cheio
inteiro
não mais distante;
lá estou eu
sendo o bastante;

E lá está você
trazendo pela mão
o perdão
dizendo que está tudo bem;

Meu próprio paraíso
livre de penar ou juízo,
meu abrigo aberto
vasto, completo
de erros, conquistas
e dores.
E amores. Todos amores.

E você, num vestido vermelho
do beijo, o nosso primeiro;
E você me leva além
e além, adiante
para ser o bastante, o bastante;

E vocês me abraçam, me tocam
e os corpos unidos nos completam
nos confortam
e há amor;

Vocês, meus amores,
dois amores
não há mais temores;

Estou aqui
e estamos todos.
Tudo que se queria ser
aqui
Todos. Nós.
Amado, completo
repleto
realizado;

Além da montanha,
além do penhasco
e eu estou com vocês.