Encruzilhada

Encruzilhada

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

estudo de personagem


I

eu sou um prisioneiro amarrado ao invisível escravo de mim mesmo herdeiro do fogo amante sonhador sou prisioneiro detento redentor das coisas que foram de desejos meus medos meus segredos meus seres passados meus seres privados sou prisioneiro para ser salvo para ser morto para ser vivo já não me queimo já não me perco já não me deixo mas pergunto o que será e qual será o porque do amor com dor de pai a filho e irmão tanto senão tanto senão meu perdão minha paixão.

II

sou sonho sou amor encanto em sua forma seu calor tantas de você que me foram que me vem e me vão e nunca me ficam no esperar espero pelo que sempre passa e nunca vem pois logo que vem deixa de ser e aí mal chegou e já se vai sonho vejo sinto choro espero sempre espero ainda que nunca espero como se nalgum sonho nalguma noite partida não precisasse mais esperar e fosse apenas graça perdida.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Bem-te-vi

Quero ser o bem-te-vi
Voar de dia
Me esconder de noite
E cantar 
Cada vez que te vir por aí.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

O canto e o tom do tempo

De tanto testar o tempo
Entendi o tormento
De tentar existir
Acertando

Todo encontro
Entre cantos e talentos
Pontos e momentos
Trouxe então um conto,
Temor e testamentos

Tudo quanto tive antes
Destruí,
Tendo tal um toque,
Tentando desistir,
De tentar
Acertar;

E aí, entendi,
Tenaz e também triste
Tanto o tempo a me trair:
Eis que o tempo não existe.


quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Diário do Festival do Rio: Maravilhoso Boccaccio, Tudo que aprendemos juntos e O clã

Originalmente publicado no ORNITORRINCO

== Maravilhoso Boccacio ==
Depois de ter assistido a ‘César deve morrer’ há alguns anos, eu veria qualquer coisa dirigida pelos irmãos Vittorio e Paolo Taviani, que eu conheci por demais tarde nesta vida.
‘Maravilhoso Boccaccio’, seu novo novo trabalho depois de ‘César…’, não chega a ser uma obra-prima, mas tampouco é ‘qualquer coisa’.
Adaptando cinco das cem histórias do ‘Decamerão’, os veteranos de 86 e 83 anos, respectivamente, fazem um filme bonito, luminoso e divertido.
O único porém é que, sendo os contos de Boccaccio tão bons, é uma pena que haja apenas cinco deles, enquanto tanto tempo de tela é dedicado à narrativa que liga as histórias - também adaptada da premissa do Decamerão - seguindo um grupo de dez jovens em fuga de uma Florença assolada pela Peste Negra, na Idade Média. Fosse mais enxuta toda essa parte, uma dose a mais de Boccacio não faria mal a ninguém.

== Tudo que aprendemos juntos ==
Apesar de uma estrutura esquemática, que em muito remete a tantas outras histórias do professor que alcança redenção ensinando um grupo de rejeitados, é o coração de ‘Tudo que aprendemos juntos’ que faz a diferença.
As sequências de música são excelentes. E é possível sentir a paixão por trás do projeto, especialmente nas performances dos estudantes e de Lázaro Ramos, um protagonista algo introspectivo e solitário, que em momento algum abraça qualquer tipo de heroísmo em sua jornada.
Preparados por Fátima Toledo (’Tropa de Elite’, ‘Cidade de Deus’) e dirigidos por Sérgio Machado (’Cidade Baixa’), um incentivador da improvisação no set, os jovens que interpretam os integrantes da orquestra de Heliópolis iluminam a tela em suas participações, com especial destaque para Kaique Jesus (o menino Reginaldo, de ‘Linha de Passe’) e o estreante Elzio Vieira.  
Curiosidade: aos antigos fãs de Cavaleiros do Zodíaco, fiquem de olho em uma rara participação do ator e dublador Hermes Baroli, interpretando aqui o amigo do personagem de Lázaro Ramos.  
== O clã ==
Recomendo que o leitor não procure saber muito sobre ‘O clã’ antes de ir ao cinema. Mais uma vez, fuja das sinopses e dos trailers. Quanto menos você souber, melhor. Nessa linha livre de spoiler, posso dizer que é uma história baseada em fatos reais, que se passa no fim da ditadura militar argentina, e envolve desaparecidos políticos.    
O novo filme de Pablo Trapero (’Abutres’, ‘Elefante Branco’, ‘Leonera’), premiado em Veneza por sua direção, é corajoso e ousado em sua abordagem. Trapero é seguro e arrojado na condução da trama, mergulhando o espectador no dia a dia de uma família com uma história incrível, ainda que deixe determinados furos no caminho (entre alguns pontos que deixam a desejar, há o retorno de um dos filhos, por demais mal contado).
Há ainda uma performance absolutamente arrebatadora de Guillermo Francella, ator de um carisma que, em determinados momentos, chega a ser assustador.    
Próximas sessões:
Quarta, 14/10 14:00 Roxy 1
Quarta, 14/10 19:00 Roxy 1

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Diário do Festival do Rio: The lobster e Anomalisa

Originalmente publicado no ORNITORRINCO


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== The lobster ==
Vencedor do Prêmio do Júri de Cannes, ‘The lobster’ trata de uma sociedade futurista em que solteiros (e viúvos, e divorciados) são enviados a um hotel. O recém-chegado pode cadastrar-se como hetero ou homossexual – o bissexualismo foi abolido por causar problemas operacionais. Homens e mulheres são vestidos de acordo com um mesmo padrão, e quem não se apaixonar em até 45 dias será transformado em um animal.
Capitaneando essa história está o grego Yorgos Lanthimos, cujos trabalhos anteriores eu desconheço, mas que aqui demonstra segurança e autoralidade, encontrando seu próprio estilo em meio a referências a Wes Anderson e Stanley Kubrick.
O resultado é uma espécie de ficção científica de humor negro, altamente sarcástica, e algo romântica, que surpreendentemente funciona, formando uma alegoria que investiga o casamento, as relações, o amor, e a imposição de determinados valores morais sobre uma sociedade.
Ainda vale menção à qualidade do elenco (‘The lobster’ é estrelado por Colin Farrell, Rachel Weisz, Léa Seydoux, John C. Reilly e Ben Whishaw), além da fotografia e direção de arte inspirados.


Não há mais sessões de ‘The lobster’ no festival.
== Anomalisa ==
Este pra mim é um dos filmes do ano. 
‘Anomalisa’ é o novo trabalho de Charlie Kaufman, roteirista de filmes como ‘Quero ser John Malkovich’, ‘Adaptação’ e ‘Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças’.
Eu fui ao cinema assistir a esse filme sem saber nada sobre ele, a não ser que era a nova experiência de Kaufman na direção, sete anos depois de ‘Sinédoque, Nova York’.
E por isso recomendo ao leitor que faça a mesma coisa. Tire 90 minutos da sua vida para assistir isso. Há mais duas sessões, dá pra comprar ingresso aqui.
Próximas sessões:
Quarta, 14/10 17:00 Cinepolis Lagoon 6
Quarta, 14/10 21:30 Cinepolis Lagoon 6

domingo, 11 de outubro de 2015

Diário do Festival do Rio: Olmo e a gaivota e Tudo vai ficar bem

Originalmente publicado no ORNITORRINCO

== Olmo e a gaivota ==
No meio do caminho entre ficção e realidade, ou além de todas as noções de ficção e realidade, está esse novo trabalho de Petra Costa (’Elena’).   
‘Olmo e a gaivota’ é simplesmente apaixonante. O projeto acompanha dois atores do Théâtre Du Soleil às voltas com uma gravidez e os ensaios para uma montagem de ‘A Gaivota’, de Tchekhov.
De início o espectador pensa se tratar de um documentário. No meio do caminho, passamos a questionar se o que estamos vendo é vida ou encenação. E eventualmente, nos desapegamos e deixamos de nos importar para apenar nos deleitarmos com um estudo poético da maternidade, do amor e do ofício de interpretar, protagonizado por personagens cativantes (como não querer abraçar Serge e Olivia, e fazer parte do seu grupo de amigos, cada um de um canto do mundo, dançando, bebendo e cantando ao violão?). 
Se ‘Elena’ era uma poderosa estreia em longas-metragens, ‘Olmo e a gaivota’ - aqui co-assinado por Lea Glob - vem para consolidar Petra como uma das cineastas mais interessantes de se acompanhar no Brasil.
Não há mais sessões de ‘Olmo e a gaivota’.    
== Tudo vai ficar bem ==
Desde a primeira cena, há um problema sério com o novo filme de Wim Wenders. Este problema se chama James Franco. Não sou dos que o repudiam (nos EUA há quem o considere uma grande piada), mas aqui, possivelmente no intuito de interpretar um personagem que tem dificuldades em sentir e se afetar com o que acontece ao seu redor, Franco faz uma única expressão facial (a testa franzida), fala em sussurros, e age como se estivesse sempre sonolento, cansado ou entendiado. Na tela, há apenas vazio. Talvez funcionasse melhor com alguém mais carismático que Franco. Aqui, não funciona. Porque um personagem completamente desinteressante é difícil de seguir.
Ainda assim, há qualidades em ‘Tudo vai ficar bem’. Apesar da trilha sonora por demais intrusa, o fotógrafo Benoît Debie filma lindamente, algumas cenas se sobressaem (como o reencontro entre o protagonista e a personagem de Rachel McAdams), sem falar que a montagem da sequência do telefonema entre Franco e Charlotte Gainsbourg - aqui desperdiçada - é especialmente inspirada. 
O curioso é que, em seus primeiros dois terços, ‘Tudo vai ficar bem’ parece totalmente equivocado, com saltos temporais abruptos, cenas que não chegam a lugar algum e um sotaque francês inexplicável para Rachel McAdams. 
No entanto, o filme, que segue um escritor cuja trabalho parece crescer e melhorar após um acidente de carro, ganha um pouco de força no seu terço final, quando finalmente encontra uma dinâmica interessante na relação entre o protagonista e um outro jovem. A partir deste momento, as escolhas de Wenders parecem fazer mais sentido, como se ele estivesse desenvolvendo uma narrativa literária no cinema, desviando-se das convenções dramáticas de um longa de duas horas.
Não é o bastante, mas poderia ser, fosse outro o ator no posto principal. 
Próximas sessões:
Sábado, 10/10 18:30Cinepolis Lagoon 5
Domingo, 11/10 14:00 Roxy 1
Domingo, 11/10 19:00 Roxy 1
Terça, 13/10 16:15 Kinoplex São Luiz 2
Terça, 13/10 21:15 Kinoplex São Luiz 2